“Papai, eu queria confessar que agora eu
descobri que realmente gosto de matar”. Che Guevara (apud BRAVO, 2004, p.136)
“Não preciso de prova para executar um
homem – apenas de prova acerca da necessidade de executá-lo”. Che Guevara (apud
ORTEGA, 1970, p.179).
Conforme já divulgamos, a Organização das Nações Unidas para Educação,
Ciência e Cultura (UNESCO) dispôs que os escritos de Ernesto Che Guevara sejam
incluídos no Programa Memória do Mundo, ou seja, como “Patrimônio da
Humanidade”. Segue abaixo um relato de Pierre San Martín sobre o tipo de homem
que a ONU homenageia.
***
Aconteceu durante os últimos dias de dezembro de 1959; na escuridão da
cela, dezesseis de nós dormiam no chão, enquanto outros dezesseis ficavam de
pé, para que então pudessem descansar. Mas ninguém pensava nisso. Pensávamos
somente no fato de estarmos vivos e que isso era o mais importante. Vivíamos
hora por hora, minuto por minuto, sabendo que qualquer segundo poderia ser o
último.
Certa manhã, o som o horripilante daquela porta de aço enferrujado
quando abria nos pôs de pé, e os guardas do Che empurraram um novo prisioneiro
para dentro da cela. Era um menino, talvez com uns 12 ou 14 anos. Seu rosto
estava machucado de sangue. ‘O que você fez?’, perguntamos-lhe, horrorizados.
‘Tentei defender o meu pai’, balbuciou o menino sujo de sangue. ‘Mas eles o
mandaram para o paredão’.
Todos se entreolharam como se para encontrar as palavras certas a fim de
consolar o menino, mas não as encontramos. Estávamos cheios de nossos próprios
problemas. Havia dois ou três dias que não executavam ninguém, e tínhamos cada
vez mais esperança de que isso chegaria ao fim. As execuções são cruéis, tiram
a vida quando você mais precisa dela para si e para outrem, sem levar em
consideração seus protestos ou desejos.
Nossa alegria não durou muito. Quando a porta se abriu, chamaram 10 para
fora, entre os quais o menino que acabara de entrar. Erramos, pois aqueles que
eram chamados nunca mais eram vistos.
Como é possível tirar a vida de uma criança dessa forma? Simplesmente
não podíamos acreditar que eles matariam o garoto. Então começamos a insultá-lo
– ao homem que, mãos na cintura, andava de um lado para outro do sangrento
pavilhão de execução e cuspia suas ordens: o próprio Che Guevara! ‘Ajoelhe!’
Dizia ao menino.
Nós todos gritávamos de nossa cela para que ele não cometesse esse crime
e oferecemos a nós mesmos em seu lugar. O garoto o desobedeceu com uma coragem
inexprimível em palavras e lhe respondeu com esta infame afronta: ‘Se vocês vão
me matar’, disse ele, ‘vão ter de fazê-lo enquanto ainda estou de pé. Homens
morrem de pé!’.
Che posicionou-se atrás do garoto e disse: ‘Pois você é um rapaz
corajoso...’. Então vimos Guevara sacar sua pistola. Ele encostou o cano atrás
do pescoço do garoto e disparou. O tiro quase arrancou sua cabeça.
Nós nos inflamos: ‘Assassinos, covardes miseráveis!’. Che finalmente
olhou para cima, em nossa direção, apontou-nos o revólver e esvaziou o pente.
Não faço idéia de quantos de nós foram mortos ou acidentados. A partir desse
horrível pesadelo, do qual nunca conseguiremos acordar, conquanto feridos e na
clínica estudantil do hospital Calixto Garcia, uma coisa ficou clara: a única
regra do jogo era escapar, a nossa única esperança de sobreviver.
Tradução: Ernane Garcia
Disponível em: http://www.trenblindado.com/Sanmartin.html (Inglês)
Disponível em: http://www.cubaeuropa.com/historia/Che/Che6.htm(Espanhol)
BRAVO, Marcos. La Otra Cara Del Che. 1. ed. Bogota: Editorial Solar,
2004. 558 p.
ORTEGA, Luis. Yo Soy El Che!. Mexico: Ediciones Monroy-Padilla, 1970.
ORTEGA, Luis. Yo Soy El Che!. Mexico: Ediciones Monroy-Padilla, 1970.
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