1
maio 2013
Armando Valladares (*)
Ao ler esse discurso papal sobre o flagelo
da pobreza, não pude deixar de lembrar dos meus irmãos cubanos, pobres entre os
mais pobres latino-americanos e caribenhos, vítimas de mais de 50 anos de
comunismo.
Evoquei tantos lances lamentáveis da
diplomacia vaticana para Cuba comunista nas últimas décadas, que de uma maneira
ou de outra favoreceram a continuidade da ditadura cubana.
E me perguntei com legítima expectativa,
enquanto católico cubano, qual será, durante este novo pontificado, a
orientação da diplomacia vaticana para a pobre Cuba, a outrora “pérola das
Antilhas”?
Até o momento, não são muitos os elementos
de que se dispõe para levantar uma hipótese sobre o que poderá ocorrer.
Trata-se, sem dúvida, do teste cubano.
A expectativa e até a ansiedade dos
cubanos sobre os rumos da diplomacia vaticana para Cuba comunista se justifica,
porque o drama da ilha-cárcere já se prolonga durante demasiado tempo.
Depois da viagem de João Paulo II a Cuba,
em 1997, o então arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio, publicou o
livro “Diálogos entre João Paulo II e Fidel Castro” (Ed. Ciudad
Argentina, Buenos Aires, 1998), uma edição que parece estar esgotada, porém que
na eventual reedição poderá dar luz sobre o pensamento de Francisco sobre o
problema cubano.
Diversos comentaristas lembraram o papel
do arcebispo de Buenos Aires, cardeal Bergoglio, como presidente da comissão de
redação do documento da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e
do Caribe (CELAM), cujos membros se reuniram no Santuário de Nossa Senhora
Aparecida, Brasil, em 13 de maio de 2007.
Francisco teria presenteado tal documento
a mandatários recentemente recebidos em audiência pelo novo pontífice, como foi
o caso da presidente argentina.
Em maio de 2007, antes dessa reunião da
CELAM, tive oportunidade de enviar “minha angustiada interrogação, enquanto
católico cubano e ex-preso político nos cárceres comunistas durante 22 anos, a
respeito de se esta reunião da CELAM abordará o drama dos católicos cubanos ou
se, mais uma vez, optará pelo silêncio”.
Também constatava que “o sofrimento
espiritual do rebanho católico cubano em relação à atitude complacente dos pastores
ante os lobos vermelhos é dilacerante”.
E lembrava que durante a reunião do Encontro
Nacional Eclesial Cubano (ENEC), o então arcebispo de Santiago de Cuba,
monsenhor Pedro Meurice, reconheceu que no começo os fiéis católicos cubanos
consideravam os eclesiásticos desse país como membros de “uma Igreja de
mártires”, mas que depois, por essa atitude colaboracionista com a ditadura
castrista, “dizem que somos uma Igreja de traidores”.
Um resumo dessa mensagem aos participantes
da CELAM foi divulgado pela Agência Católica de Informações (ACI):
(“Ex-preso político pede que drama cubano não passe desapercebido na 5ª
Conferência”, ACI, 06 de maio de 2007).
Uma mensagem pública aos membros desse
organismo, difundido pela imprensa e nas redes sociais, e entregue em mãos à
boa parte dos altos eclesiásticos participantes e a seus assessores, no próprio
local do evento, em Aparecida. Nessa mensagem, eu expressava
Lamentavelmente, nessa oportunidade, o
silêncio da CELAM sobre o tema cubano foi total.
Dois meses depois, os diretores da CELAM
partiram para Havana, para participar da 31ª assembleia ordinária da entidade
eclesiástica.
Apresentava-se outra oportunidade
imperdível para que a CELAM rompesse com o muro do silêncio, da indiferença e
da vergonha que asfixia meus irmãos cubanos, pobres entre os mais pobres,
órfãos espirituais entre os mais órfãos, que sofrem na ilha-cárcere do Caribe.
Antes de começar o encontro eclesiástico
em Havana, autoridades da CELAM haviam recebido comoventes cartas, assim como
pedidos de ajuda por parte de fiéis católicos, de mães e esposas de
presos-políticos, sobre as generalizadas violações de direitos humanos e
religiosos aos habitantes da ilha-cárcere.
Depois do encontro eclesiástico houve, inclusive,
uma reunião de duas horas e meia entre representantes da CELAM e representantes
da ditadura cubana. Não obstante, monsenhor Emilio Aranguren, bispo da diocese
cubana de Holguín, se apressou a esclarecer que nessa reunião simplesmente “nenhum
desses temas foi posto na mesa”, porque se havia conversado unicamente “sobre
os temas que eram verdadeiramente importantes para os bispos presentes”.
No inferno cubano, a asfixia e o
extermínio espiritual e físico do pobre rebanho, ao que parece não era um tema
suficientemente importante. O bom pastor está disposto a dar a vida por suas
ovelhas (Cf. São João, 10,10). O que dizer daqueles pastores que deixam suas
ovelhas a mercê do lobo, parecendo ignorar o drama dos fiéis católicos cubanos,
pobres entre os mais pobres, física e espiritualmente?
Na “ostpolitik” eclesiástica para
Cuba, até o momento foram vários os autores. Entre eles, a secretaria de Estado
da Santa Sé, bispos católicos cubanos, cardeais e bispos católicos
norte-americanos, e cardeais e bispos católicos latino-americanos. Dediquei ao
tema dezenas de respeitosos e sinceros artigos, durante os últimos anos.
Nesta ocasião, evoco esses dolorosos fatos
eclesiásticos na angustiada, expectante e filial perspectiva de saber como será
a orientação da diplomacia da Santa Sé, durante o prontificado de Francisco,
com relação a Cuba. Trata-se do teste cubano. A atual conjuntura da Igreja,
interna e externa, talvez seja uma das mais dramáticas de sua História. Que em
relação ao futuro da ilha, a Virgem da Caridade do Cobre, Padroeira de Cuba,
ilumine a mente, as decisões e os passos dos atuais e mais importantes
protagonistas, especialmente, do novo pontífice.
_______________
(*) Armando Valladares,
escritor, pintor e poeta. Passou 22 anos nos cárceres políticos de Cuba. É
autor do best-seller “Contra toda esperança”, onde narra o horror das prisões
castristas. Foi embaixador dos Estados Unidos ante a Comissão de Direitos
Humanos da ONU sob as administrações Reagan e Bush. Recebeu a Medalla
Presidencial del Ciudadano e o Superior Award do Departamento de Estado.
Escreveu inúmeros artigos sobre a colaboração eclesiástica com o comunismo
cubano e sobre a “ostpolitik” vaticana para Cuba.
Dois artigos relacionados, escritos por Armando Valladares: Bento XVI, CELAM e “favela” cubana (30 de abril de 2007) CELAM em Cuba: “diálogo cordial” entre lobos e pastores (27 de julho de 2007).
Dois artigos relacionados, escritos por Armando Valladares: Bento XVI, CELAM e “favela” cubana (30 de abril de 2007) CELAM em Cuba: “diálogo cordial” entre lobos e pastores (27 de julho de 2007).
Tradução: Graça Salgueiro
Extraído do blog O que está acontecendo na América Latina?
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